Como adulto, a preocupação para com
o Pai Natal era nula, congruentemente inexistente com a sua própria inexistência.
O Natal era relaxante. Repousante. Momentos repousados nas coloridas achas da
lareira, no abraço quente da família.
Mas agora, bem… a partir do
momento em que me tornei criança, o Natal transformou-se num dia emocionalmente
complexo e stressante.
Os adultos não entendem. Como
poderiam entender. Passo meses a pensar nas prendas, a escolhe-las, a
assinala-las nas revistas, a deseja-las, a decora-las, a escreve-las nas cartas
ao Pai Natal. No fim, no fim nunca me sai nada do que pedi. Ainda por cima a
nossa perceção de tempo é completamente diferente da dos adultos. Para eles a
noite passa num ápice, mas para nós, num ápice não se passa a noite. Desde o
anoitecer até às zero horas, a ânsia eterniza-se, em expectativa. Agora o
bacalhau é imprestável, sem sabor, completo com as batatas secas e couves
azedas. E, quer queiramos ou não, passamos a acreditar no Pai Natal.
Como é que isso é possível? Não
faço a mínima. Por causa deste fenómeno ficamos horas e horas à janela, a ver
se o vemos voar pelo céu, no trenó. É uma constante espera para o apanhar, mas é
o fracasso a apanhar-nos sempre.
Os adultos ainda gozam connosco
devido à nossa crença. À meia-noite à sempre um deles que se disfarça de Pai
Natal. Deve-lhes dar um gozo do caraças tentar-nos enganar, a nós, que somos
crianças. Como se não percebêssemos que aquele não é o Pai Natal verdadeiro.
Daaah!
Depois vem a distribuição das
prendas. Ficamos ali parados, ansiosos por ouvir o nosso nome, a ansiar sempre
por mais uma, a ansiar pela desejada. Infelizmente, o Pai natal nunca me dá o
que quero, dá-me sempre o que preciso. Não percebo. Nunca hei de perceber. Se o
Pai Natal é assim tão inteligente, se consegue saber quem são as crianças que
se portam mal e as que se portam bem, como é que não percebe que aquilo que eu
quero talvez seja aquilo que eu precise?
Adultos… O Natal é para eles.
Fingem que o Pai Natal não existe e passam a vida a divertir-se a comprar
prendas. Não entendem, não percebem a nossa ânsia. São demasiado velhos para
decrescerem ao nosso pensamento.
Como gostava que não fosse assim,
como gostava de um Natal mais relaxante. Como gostava de voltar a ser adulto, nem
sei porque dantes desejava ser criança.