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Porque somos tão iguais?

Certo dia, um amigo meu afirmou que até na diferença somo iguais. Obviamente senti a minha individualidade afectada. Propus-me logo a refutar. Afirmei que apesar de tudo, os acontecimentos mais insignificantes que acontecem na nossa vida, tocam a cada um de uma forma tão pessoal, que nos torna indiscutivelmente e completamente diferentes uns dos outros. Lógico que isto em nada contradiz a afirmação inicial, e por mais argumento com que eu me abasteça, o facto de todos nos sentirmos tocados por certos e determinados acontecimentos demonstra a nossa igualdade.

Sendo assim, temos mais parecenças do que diferenças. Negar isso imediatamente é tomar uma atitude emocional e estereotipada em relação ao mundo. E porquê esta atitude? Talvez a defesa da nossa individualidade tenha, como objectivo básico, a sobrevivência. Pois, sem auto estima talvez não sobrevivamos.

Quer seja ou não verdade o que afirmei atrás, facto real é que há sociedades que acreditam na supremacia dos seus valores e dos seus rituais, negando acerrimamente os valores dos outros.

O que essas sociedades ou pessoas não compreendem, é que os valores não variam assim tanto, só a forma como os buscamos. Qualquer sociedade, em Portugal, ou na Indonésia, tem como valores a verdade, o amor, a felicidade, a família, a protecção, a vida, entre outros. A única coisa que muda são as crenças.

Por exemplo, numa sociedade acredita-se que a felicidade se alcança através do amor, outra através das posses materiais, outra através do prazer momentâneo, e por ai fora.

Então, porque temos valores tão iguais que nos igualam de forma tão intrínseca? Penso que seja porque partimos todos da mesma equação inicial. Essa equação faz com que geneticamente, ao nascermos, precisemos de uma família, de carinho e protecção para sobrevivermos. Partimos todos do mesmo ponto inicial, a herança genética e a família. Isso faz com que todos partilhemos dos mesmos valores.

Por isso, olhando para o ser humano de uma forma geral e abrangente, penso que em termos de proporção, tanto as características que nos diferenciam como as que nos igualam, são quantitativamente equivalentes. Mas, qualitativamente “o que nos une é mais forte do que aquilo que nos separa”.

“Na arte de viver, o homem é ao mesmo tempo o artista e o objecto da sua arte, é o escultor e o mármore, o médico e o paciente.”

Nesta citação está implícita a ideia, de que o ser humano é um ser activo em relação à vida. Ponto de vista nem sempre aceite em algumas teorias.

Por exemplo, em psicologia a teoria Behaviorista, que tira partido do Empirismo, afirma que o ser humano “nasce como uma tábua rasa”. Ou seja, não nascemos com ideias inatas. Sendo assim, é o ambiente que molda o sujeito, condicionando-o. Nós seremos não aquilo que quisermos ser mas sim o que a sociedade permitir, ou quiser que nós sejamos. Este determinismo elimina qualquer responsabilidade e liberdade do ser humano.

Por outro lado, teorias como a Evolucionista, ou a Ecologista afirmam que o ser humano nasce com uma herança genética. Isto permite que este esteja apto para absorver os “inputs” ambientais, a interagir com eles e a modifica-los. Sendo assim, acaba por existir um relacionamento dual, em que um modifica o outro e vice-versa. O ser humano é então um ser activo no seu próprio desenvolvimento, com liberdade e responsabilidade pelas suas escolhas.

Deste modo, a liberdade é uma característica essencial, se quisermos definir o sujeito como ser activo ou passivo, responsável ou não responsável em relação à vida. Sem essa liberdade, sem essa responsabilidade, jamais poderíamos ser, o artista, o escultor, ou o médico. Seriamos só objecto, mármore e paciente.

Aqui se encontra a maravilha da vida, a consciência de que a nossa liberdade passa por um assumir da nossa responsabilidade. Embora essa responsabilidade seja partilhada, pois somos frutos de uma sociedade, ela é também nossa como seres de livre escolha. Como seres de livre escolha temos também a responsabilidade pelo mundo que nos rodeia. E, é esta responsabilidade pelas escolhas que aos poucos faz com que passemos de egocêntricos a altruístas. Apercebemo-nos que não podemos sair impunes pelo mal que cometemos. Tornamo-nos aptos a medir as consequências dos nossos actos. E moldamo-nos em direcção à perfeição e rectidão sabendo quais as acções melhores para atingir os valores universais e intrínsecos de cada sujeito.

Concluindo, será que é a isto que se pode chamar de ética? Porque se for, então a definição de ética como arte de viver é a mais correcta, porque tal como a arte é um caminho para o belo, a ética é um caminho para a escolha justa.

Lua Azul

A lua tem muitas cores. Branca, cinzenta, amarela, negra como o céu, ou vermelha nos filmes. Hoje, nenhuma dessas cores reflecte na sua face. Hoje, um azul-escuro preenche-a, igual aos guaches que usava na escola. É como se alguém, ao molhar o pincel dessa tinta, esborrata-se no céu uma mancha redonda e rugosa.

Da janela da minha casa a irrealidade desenrola-se perante meus olhos. A pouco e pouco mais janelas abrem. Mais cabeças saem. Mais olhos se fixam. Nas ruas travam os carros. Param os passos. Dá-se lugar à fixação do olhar no irreal.

- Mas que puta de merda é esta?

Só podia ser o malcriado do vizinho de cima a cuspir estas palavras. Infelizmente hoje vou concordar com ele.

Afasto-me da janela. Volto os meus sentidos para o silêncio da sala. Ligo a televisão e imagens saltam sem parar. Jornalistas, teólogos, filósofos, políticos lutam por falar. Deixo-me ficar por um comentador científico.

Segundo ele, ainda não tendo certezas do porquê, parece que o fenómeno do aspecto azulado da lua se deve à elevação da água do oceano. Esta, com uma força fenomenal “corre”, por assim dizer, em direcção à lua através de um cilindro, que esta própria forma, de dezenas de Km2. Extraordinariamente, ao passar a atmosfera não sofre alterações de estado, estando a depositar-se na superfície lunar e a formar uma atmosfera idêntica à da terra. Outro factor inexplicável é o facto de esta corrente de água estar a transportar todos os seres marinhos. Até agora nenhum ser humano ou barco entrou no fluxo. Estes ficam, sem explicação, na margem do tudo. Um levantamento sobre as consequências confirma que, por este andar, a terra ficará sem água no prazo de uma semana.

Mais nada foi dito de interesse, apenas um conjunto de avisos e propostas que me incutiram ainda mais ansiedade. Volto à janela. Encosto as mãos no parapeito incomodando-me com a sua frialdade e observo a maré vazar.

- Parece que o raio dos peixes decidiram fugir de nós. Âh vizinho? Fudemos tudo!

Outra vez o chato! Mas ao olhar para a lua, o mais chato é ter novamente que concordar com ele.

Impressões II

Toda a gente se parece com toda a gente. Sinto que isto não é só o meu pensamento estereotipador a actuar, é muito mais que isso. As pessoas estereotipam-se a si mesmas. Facto inegável é a nossa adopção (consciente ou inconsciente) de estilos idênticos aos do grupo com o qual nos identificamos: a fala; o andar; o vestir; entre muitos outros.

Incomoda-me e angustia-me, o facto de, eu não querer estereotipar e não conseguir. Sinto que, por todos quererem ser identificados com algo, e mesmo os que não têm essa intenção inevitavelmente o serem, a minha mente é forçada a estereotipar.

Por isso, ao andar pela cidade de Lisboa olho para todas as pessoas como se apontasse o dedo, classificando-as: pobre; rico; extremamente pobre; novo-rico; classe alta; classe baixa; trabalhador; sem noção; porco; beto; beta; meninos da mamã; convencido; convencida; arrogante; infeliz; cansado; bem-disposto; divertido; “top model”; snob; estrangeiro; indiano; italiano; africano; lisboeta; nortenho; “guna” (chunga); “dondoca”; homossexual; empresário; empresária; “macho men”; empreiteiro; trolha; desconfiado; inteligente; confiante; “hip hoper”; confiante; simpático; humilde; secretária; intelectual; cota; manipulador; passivo; defensivo; tóxico dependente; alcoólico; VIP; azeiteiro; até personagens da televisão (Chuck Norris, Sylvester Stallone, Arnold Schwarzenegger, Britney Spears, Angelina Jolie, etc); e mais todos os outros estereótipos imagináveis.

É isto que muitas vezes se passa na minha cabeça, quando caminho pelas ruas, ou quando ando no autocarro ou metro de Lisboa. A dimensão populacional é tão vasta que cria novos grupos e aumenta os grupos já existentes, isto torna impossível ninguém se parecer com ninguém.

Sendo assim, deixo-me influenciar pela dimensão, pela mensagem que as pessoas através do aspecto querem transmitir e pela imagem que muitos não conseguem evitar, logo rotulo. Tento ver para além das evidências, mas não consigo. È como se a imagem barrasse a minha percepção ao ser humano que existe por detrás dela. Mesmo assim, essa é uma característica da qual eu não me esqueço. Que aquele à minha frente é um humano como eu, com os seus dramas, pensamentos, alegrias e tristezas.

Ao chegar a casa dou por mim a identificar-me como um ser humano, por isso penso: E eu? Com quem me pareço?

Objectivos

Todos nós temos um objectivo na vida. Um objectivo comum, universal. Qual? Exactamente! A felicidade. Básico, sim. Simples, não. Depois deste grande objectivo vêem os objectivos individuais e concretos de cada um. Estes variam dependendo da história de cada um, dos gostos de cada um, da vocação de cada um. Deles nos servimos para atingir o objectivo primordial e são precisamente eles, que tornam a felicidade simplesmente complicada. É que, ao olharmos para a vida, deparamo-nos com tantos caminhos, com tantas formas para atingir a felicidade, que acabamos por nos perder na encruzilhada.

Mas, deixemo-nos de focar naquilo que eu acho. Não é minha intenção falar de mim, nem tão pouco vos mostrar o que penso do mundo. Minha intenção é contar-vos a estória de Inês. Por isso, passemos a focar-nos nela.

Tudo o que vos falei anteriormente serve como base de comparação a esta rapariga. Ela, como tantos outros adolescentes de vinte e quatro anos, tem, digamos, uma falha na motivação, que deriva do facto de já ser feliz. Aliás, ela nunca pensa muito nisso, é-o e pronto. O que realmente ela nunca foi é infeliz. Vem de uma família de classe média. Os pais sempre lhe deram tudo, nunca lhe faltou segurança. A sua memória permitiu-lhe boas notas. Facilmente entrou num curso qualquer e facilmente acabou-o. Inês sempre viveu naquele mundinho, em que, nunca se teve que esforçar por ter o que tinha. Por isso, agora, tanto lhe faz. Objectivos? Projectos? Para quê?

A sala é normal, vulgar. Duas estantes repletas de livros estendem-se nas paredes laterais. A secretária é cinzenta, de costas para a janela que preenche a parede. Um vulgar portátil pousa nela. De resto, está vazia, apenas com as folhas do homem de meia-idade e cabelos brancos que se senta atrás dela. Sentada à frente da mesa, Inês responde às perguntas com naturalidade. Sempre calma, com um sorriso sociável e confiante. O seu coração bate tranquilamente, e nem os sovacos nem as mãos expelem suores frios.

O entrevistador não se interessa por ela devido à sua beleza, embora seja bonita, nem pela sua inteligência, simpatia, ou pelas suas respostas correctíssimas. Interessa-se por algo mais subtil, algo que tenho vindo a falar nesta estória. Interessa-se por aquilo que ela não tem.

Como é que ele sabe? Não sei. Talvez as perguntas estivessem inclinadas com esse propósito. Mas elas foram técnicas de mais. Penso que logo de inicio ele já sabia. Porque ele, com o seu olhar perspicaz vê. Vê para além das aparências. As perguntas eram apenas a introdução para a pergunta fundamental. Uma pergunta que foge a todas as outras.

- Menina Inês, como gostaria de morrer? Diz ele pausadamente.

Apesar de achar a pergunta estranha, ele não vê nenhum olhar malicioso no homem e responde:

- Nunca pensei nisso, mas acho que de facto, não gostaria.

- Sabe. Quem não morre, não vive.

Desta vez, já um pouco desconfiada e apreensiva.

- Mas o que tem isso a ver com o emprego?

- Com o emprego nada, mas consigo tudo.

A cabeça dói-lhe. Quando abre os olhos, a luz do dia introduz-lhe alfinetadas no cérebro. O chão é duro, e cheira ao dióxido de carbono dos carros. Inês encontrasse deitada no passeio e ao olhar para cima vê o homem de meia-idade e cabelos brancos. Ele ajuda-a a levantar-se. Ela, assustada e desnorteada pergunta.

- Quem é você? Que se passa aqui?

- Menina Inês. Quem eu sou não interessa. Basta-lhe saber que ajudo pessoas que precisam, é a minha condição. Você precisa. Tem vinte e quatro horas, para descobrir uma resposta a uma pergunta deveras importante para si. Se não a descobrir, sinto muito, mas morrerá. O que é viver verdadeiramente?

- Mal terminou a pergunta, o homem fica transparente e num segundo desapareceu. Nesse segundo Inês passou a ter o objectivo mais básico de todos, sobreviver. As vinte e quatro horas seguintes, bem, imaginemo-las.

Impressões

Lisboa. Entro no metro, entalo-me nas latas de sardinha. Subo escadas, desço escadas. Percorro os passeios. Confundo-me entre um emaranhado de sons vocais, pedestres e automobilísticos. Enquanto vagueio vou olhando para as personas que me rodeiam.

Reparo que as expressões faciais que vou observando são peculiarmente parecidas. A maiorias das pessoas com quem me cruzo tem, por assim dizer, uma não expressão. Uma expressão que prima pelo não reflexo de uma emoção. Por isso, toda a gente com quem me cruzo parece ameaçadora e intimidativa, zangada e má.

Eu retraio-me, ao olhar para estas caras. E na fragilidade do meu Ser vou adoptando, aos poucos, a mesma não expressão, para me defender da expressão dos outros.

Há coisas que nunca mudam

Há coisas que nunca mudam. Não, não estou a falar dos acontecimentos banais do nosso dia-a-dia, estou a falar de algo mais pessoal, a personalidade. E porquê este dilema? Ora, porque há traços nela que nos fazem agir constantemente da mesma forma errónea perante certos e determinados estímulos. Traição, vicio, ansiedade, impulsividade, raiva, violência, entre outros. Falo disto com um pouco de amargura, porque sinto que nunca deixarei de ser tudo o quede negativo eu sou.

À pouco tempo vi um documentário na televisão sobre um método terapêutico de eliminação de fobias. Tratava-se do caso de uma rapariga que fora violada e que por isso desenvolvera a fobia de sair à rua. Na clínica de psiquiatria decidiram implementar na doente um tratamento experimental. Esse consistia na escrita pormenorizada do acontecimento traumático e na constante audição do relato do acontecimento. Em cada sessão seria medido o grau de ansiedade da doente e antes de cada sessão seria administrado um fármaco. Segundo o médico psiquiatra este fármaco eliminaria as conexões neurais que estabeleciam a ligação entre a ansiedade e a história da violação. Isto só aconteceria se a doente após tomar o medicamento ouvisse e repetisse a história.

Do ponto de vista do médico era o fármaco que fazia efeito, do meu ponto de vista a constante repetição e exposição à história e o efeito “placebo” é que contribuíram para a diminuição da ansiedade. Logo, as conexões que supostamente o fármaco eliminaria ainda continuam lá.

Outra forma de transformação da personalidade, para além dos tratamentos com psicólogos, é a meditação e a oração. Esta baseia-se na repetição constante de uma característica da personalidade positiva. Por exemplo, “sou amável”, ou “sou corajoso”, ou “ sou activo”. De modo a eliminar uma característica negativa a frase meditativa deve ser sempre positiva, nunca do género “não sou arrogante”, “não sou impulsivo”. E qual a explicação neurológica para que este método elimine os traços negativos da nossa personalidade? Precisamente através da desconexão das conexões neuronais.

Hum… Dá que pensar! E eu, claro, fiquei a pensar. Reparem, desde que nascemos essas conexões são formadas e à medida que crescemos mais conexões vão sendo criadas. Essas novas apoiar-se-ão nas anteriores e assim sucessivamente, reforçando-as constantemente. Será assim tão simples eliminar conexões neurológicas que formam a nossa personalidade desde a mais tenra idade? Elas formam a base e os pilares daquilo que somos. Conseguiremos nós deixar de ser quem somos?

A esta pergunta respondo afirmativamente, mas não penso que seja possível através da desconexão neurológica. Isto devido ao que afirmei no parágrafo anterior e também porque sinta que há coisas em mim que nunca hão-de mudar. Sinto que a memória da minha história tem uma influência tão marcante na minha forma de ser, que só com um blackout total no sistema e perdendo a memória de tudo é que deixaria de ser quem sou.

Por isso, há coisas que nunca hão-de mudar. À conexões que não se conseguem desfazer, memórias que não podemos alterar. A única coisa a fazer é acrescentar. O cérebro não desaprende, reaprende. Novas conexões por cima de velhas conexões. São feitos novos caminhos, e é através disso que mudança surge. Os caminhos velhos já não são percorridos, mas sim os novos.

Posto isto, desperta-se em mim outra pergunta. Então, como consegue o cérebro guardar tanta informação? Dou um passo atrás, e volto à mesma lengalenga. Talvez os caminhos antigos, por deixarem de ser pisados, desapareçam com o tempo.

Mesmo assim, acredito que nunca deixaremos de ser quem somos, os caminhos sombrios estarão sempre lá para serem pisados junto com as ruelas claras, a única coisa que muda é a direcção neural que tomaremos.

Sempre a mesma dúvida. Liberdade?

Sempre a mesma dúvida, serei livre ou não? Serei eu dono das minhas escolhas? É a liberdade real ou não?

Há tantas teorias que nem sei por onde começar, desisto antes de tentar. Esta dúvida começou quando na igreja nos apresentavam o Deus omnipresente, omnisciente, que ouve as nossas preces e nos ajuda em tudo na vida. Ele rodeia-nos e envolve-nos, estando sempre presente em todo o nosso caminho. Ele é o início e o fim, Ele conhece o início e o fim. Sendo assim, o destino está traçado ou não? Se está, é obvio que não somos livres. E se não está traçado?

Neste caso, se Deus é um ser interveniente nas nossas vidas é lógico que também não somos livres. Daqui surge a pergunta se Deus é interveniente porquê tanto sofrimento? E a esta questão respondemos com a liberdade. O Ser que nos criou tornou-nos livres, o sofrimento surge da forma errónea de como usufruímos dessa liberdade. Deus não pode intervir, pois assim a liberdade passaria a ser parcial, ou seja, não liberdade, e não total como Ele implementou.

Sei que estes argumentos são um bocado rascas, pois podem ser perfeitamente rebatidos com a analogia de “Deus-Pai”. Isto quer dizer que como filhos temos uma liberdade limitada, e Ele como Pai intervém quando necessário. Mesmo assim, penso que a sua intervenção como pai é um pouco negligente (como qualquer filho que se preze penso assim). Por outro lado, liberdade limitada é sinónimo de nenhuma liberdade, pois eu aqui refiro-me à liberdade num sentido universal e total.

À parte disto, voltando ao assunto da intervenção ou não intervenção divina associada à liberdade, mesmo que Deus não intervenha a nossa liberdade continua a ser uma ilusão, pelo facto dele conhecer o início e o fim (o alfa e o ómega). Talvez a liberdade só seja real se a Sua omnisciência e omnipresença não existirem, junto com a sua não intervenção, ou levando ao extremo, se Ele não existir.

E, chegando a este patamar, outra questão surge. Seremos mesmo livres só pelo simples facto de Deus não existir? Esta é a minha pertinente pergunta, pois mesmo negando a existência de Deus não faz com que eu me sinta livre. Sinto que todas as minhas acções, desejos, pensamentos, são influenciados pelo meio; pelas necessidades básicas; pela cultura; por aquilo que sou e por aquilo que quero ser. Refutar isto afirmando que posso negar as necessidades e evitar a influência do ambiente, é criar mais uma ilusão de que sou livre. Isto porque, a negação é influência do que quero negar.

O que é a liberdade? Onde está a liberdade? Apesar de tudo, não gosto (como defesa do self, obviamente) de afirmar que a liberdade é uma ilusão. Também não afirmo que seja uma utopia. Digamos que é mais um ideal. Sendo assim é atingível. E penso, apesar de todo o emaranhado de influências que me empurram e puxam, eu posso aos poucos escolher quem me puxa e quem me empurra. Com uma liberdade limitada apenas à escolha, eu construo-me aos poucos em direcção à Liberdade.

Sim, gosto de pensar assim.

Work

Todos querem ser lideres mas ninguém sabe liderar.
Todos querem ser inteligentes mas ninguém sabe ser sábio.
Para ser líder basta ser inteligente, para liderar basta ser-se sábio.

Espelho meu… Espelho meu… Quem sou eu?

Parece que não me enganei quando disse que expor os meus pensamentos no papel faz com que surjam novas perguntas e respostas.

Neste caso, após ter postado o primeiro momento em que formulei a pergunta existencialista “quem sou eu”, dei pró mim a questionar a ordem cronológica desse momento. Terá mesmo sido aí o apogeu da minha busca? Lembrei-me então, que quando miúdo, criança entre os 5/6 anos (não me lembro bem), ficava longos momentos frente ao espelho, a perguntar “quem sou eu?”, “quem se esconde por detrás do meu olhar?”.

Há uns tempos atrás, enquanto lia um livrito de psicologia, dei de caras com um capítulo intitulado “O estádio do espelho”. Novamente peguei no livro ontem à noite. Li novamente o capítulo e fiquei exactamente a perceber o mesmo que anteriormente, ou seja, nada! Demasiado técnico.

Mas, segundo o que entendi, a fase do espelho está relacionada com a formulação do ego e do ego ideal. Dá-se entre os 6 e os 18 meses. A criança reconhece a sua imagem no espelho e distingue a imagem exterior da interior.

Por isso, penso que o estádio do espelho não se aplica à situação referida anteriormente. O problema que se coloca, já não é reconhecer a imagem que está reflectida, pois eu com 5 ou 6 anos já a reconhecia como minha. O problema é eu só reconhecer essa imagem. Ela abstrai-me de me ver a mim mesmo e tento olhar para além dela. Agora que penso nisso, acho que fiz exactamente o contrário do que acontece na fase do espelho. Neste caso, conscientemente, tento me desidentificar da imagem, na tentativa de encontrar algo mais que o ego, que o eu. Tento encontrar aquilo que sou, a verdadeira essência de mim.

Bem, por fim, por mais que olha-se para o espelho, não chegava a conclusão nenhuma. E ainda hoje, esse mistério faz-me sentir o corarão a bombear rápido de mais. Não, já não olho para o espelho com o intuito anterior. Agora já não preciso da sua ajuda, basta-me pensar.

Depois de investigar este estádio, cheguei à conclusão que a pergunta inicial deste texto já não é viável. Parece-me que, tanto a situação em que olho para o céu e me questiono, como a do espelho, foram exactamente na mesma altura. Não interessa a sua ordem. Foi há tanto tempo, que não me recordo. O que interessa é que eu sinto, a situação em que olho para o céu, como a mais importante. Foi onde a busca deixou de ser passiva, para se tornar activa.

O que eu quero dizer com isto? A busca de mim mesmo deixou de estar só centrada em mim. A busca de mim mesmo passou a estar relacionada com os segredos do universo.

Começo

Antes de começar, quero deixar explicito (ou mais o menos explicito) o propósito deste blog. Ora, como fazer textos bonitos e limpinhos dá muito trabalho, decidi criar um blog cujo objectivo é simplesmente o de expor ideias.

Ao contrário do blog “refuta”, neste não tentarei reproduzir crónicas, ensaios ou contos. Este é um blog um pouco mais pessoal, mas não pensem que me vou por para aqui a contar a minha vida (talvez um quito). O que eu pretendo é expor aquela parte de mim que passa a vida encravada no meu cérebro, sem me preocupar em escrever para que todos entendam as minhas ideias.

O meu problema é que por mais que tente não pensar, penso. Por mais que tente não questionar, questiono. Nem sei porque disse “por mais que tente”. Não tento! Gosto de ser assim, de procurar mais as perguntas do que as respostas. E são essas perguntas encravadas no meu encéfalo que eu quero expor. Quase como que arrancá-las, colocá-las à frente dos olhos, para poder pensar melhor nelas, de modo a achar novas respostas que me levarão a novas perguntas.

Já agora, sabem como tudo começou? Tudo começou quando eu, ainda criança, entre cinco ou seis anos de idade, olhei para o céu estrelado e pensei: Quem sou eu?